Quem já tentou vender um carro usado a lojas especializadas certamente acumulou frustrações com algumas contra-ofertas recebidas. O proprietário vai à loja com o preço da Tabela Fipe na cabeça, mas recebe de volta uma proposta bem abaixo da esperada, com reduções que podem até passar de R$ 10 mil em alguns casos.
Há vários fatores que influenciam a negociação: primeiro, os lojistas precisam mesmo pagar um valor menor que o de mercado, já que vivem disso e têm de gerar lucro na revenda — se o seu objetivo é não ter desconto, tente vender direto a outro particular. Chegar a um preço justo para ambas partes é um grande exercício de negociação, onde pesam a honestidade do profissional e a perspicácia do dono do veículo para não se deixar enrolar.
Acredite: se seu carro tem algum “esqueleto” escondido no armário, certamente quem trabalha no ramo vai descobrir. Detalhes relacionados ao estado e ao histórico do automóvel contribuem para a depreciação. E aí, mais uma vez, cabe ao lojista e ao proprietário chegarem a um acordo sobre quanto aquele problema desvaloriza, de fato, o valor do veículo.
UOL Carros foi até a Morumbi Motor, concessionária da Volkswagen que também trabalha com usados, na zona oeste de São Paulo (SP), e conversou com o gerente da área, Sidney Andriotti Junior, para entender como é feita a inspeção de um veículo. A constatação: em menos de 24 horas, é possível ter acesso à “ficha corrida” completa do carro.
“Muita gente acha que fazemos isso só para desvalorizar o carro, mas não. Trata-se de um processo em que temos que nos precaver e fazer o que é justo para os dois lados”, explica o profissional. “Às vezes tem carro que chega aqui e parece bem conservado, mas é aí que precisamos olhar com olhos de vendedor e prestar atenção nos detalhes“, acrescentou.
A avaliação de um automóvel usado numa loja especializada respeita um protocolo com os seguintes passos:
1) ESTADO VISUAL
Numa inspeção visual de cerca de meia hora, é possível determinar o estado de conservação estética do veículo,por fora e por dentro. Nessa etapa, são avaliados pintura, lataria, faróis e lanternas, pneus e revestimentos internos. Riscos, amassados, bancos rasgados e pneus carecas podem provocar descontos de R$ 250 a até R$ 3 mil, dependendo de quantidade e gravidade.
2) ESTRUTURA E MECÂNICA
Nessa mesma fase da perícia, os técnicos inspecionam carroceria, longarinas, painel frontal (não o do interior, e sim aquela barra escondida sob o parachoque, para proteção), eixos, suspensões e também motor. “É uma parte importante, porque um problema sério de motor, por exemplo, pode me custar até R$ 3 mil para consertar“, explicou Andriotti.
3) CONSULTA DO HISTÓRICO
Feita a avaliação “de olho”, é hora de verificar a procedência do carro. Para isso, os inspetores criam o chamado “laudo pericial”, reunindo cópia dos documentos e fotografias do quadro de instrumentos, mostrando a quilometragem, e também dos códigos de chassi, etiquetas e até da numeração dos vidros. Com essas informações, é possível descobrir no site do Detran regional, e também do Sinaliza — banco de dados nacional sobre veículos –, se o carro em questão usa peças originais, se está em situação regular e com impostos em dia, se já foi a leilão, se possui registro de furto, se esteve envolvido em acidente grave, se passou por sinistro de seguradora e até se está em disputa judicial. “Dependendo do caso, nós cancelamos o negócio“, disse o gerente.
Usamos como exemplo um Ford EcoSport XL 1.0 2005, que acabara de chegar ao estabelecimento. O preço tabelado pela Fipe do utilitário é de R$ 20.714, mas a perícia apontou que aquela unidade não vale mais do que R$ 11 mil.
“Descobrimos que parachoque, longarina e painel frontal estavam mexidos, sinal de que o carro foi batido. Os pneus estão carecas, os faróis estão riscados e há problemas de motor“, listou Andriotti.
E se esse mesmo carro não apresentasse nenhum desses problemas? “Aí pagaríamos, no máximo, uns R$ 15 mil“, respondeu. Ou seja: a diferença em relação à Fipe ainda ficaria em mais de R$ 5 mil.
Faróis riscados, parachoque desalinhado, pintura danificada e sinais de batida fizeram este Ford EcoSport ter seu preço depreciado em R$ 4.000
Se fechar negócio com o EcoSport, o gerente o fará apenas para garantir o negócio que o proprietário deseja fazer com um carro mais novo, onde o jipinho funciona como entrada. Neste caso, tenta repassá-lo a um vendedor independente. “Só deixo na minha vitrine os veículos em melhor estado“, esclareceu.
Diante da reportagem de UOL Carros, começou uma segunda e não menos árdua fase de negociação: o gerente que aceitara pagar R$ 11 mil no EcoSport não conseguiu oferta acima de R$ 9 mil vinda dos lojistas consultados. O prejuízo de R$ 2 mil só valerá a pena se a outra ponta do negócio trouxer lucro maior.
E, mesmo com todas as precauções tomadas, não é raro surgirem problemas — e gastos inesperados — depois que o negócio foi fechado. “Estou sempre assumindo riscos ao trabalhar com compra e venda de usados”, finalizou Andriotti.
Fonte: Uol Carros
Parabéns pela matéria.